Paulo Lindesay – Diretor da ASSIBGE-SN/Coordenador do Núcleo da Auditoria Cidadã RJ
Orçamento público é o instrumento utilizado pelo Governo Federal para planejar a utilização do dinheiro arrecadado com os tributos (impostos, taxas, contribuições de melhoria, entre outros). Esse planejamento é essencial para oferecer serviços públicos adequados, além de especificar gastos e investimentos que foram priorizados pelos poderes. Mas qual a posição política do governo Bolsonaro, na execução desse fundo público? O governo pensa em usar a maior parte do fundo público para aumentar investimento direto, na infraestrutura do país, na melhoria da qualidade dos serviços públicos à população brasileira? Ou quer destinar a maior parte desse fundo público para garantir lucros crescentes de banqueiros e das grandes corporações?
Primeiro precisamos entender alguns conceitos básicos sobre a Despesa Geral da União. Ela é dividida em duas partes. A primeira parte, o orçamento financeiro, onde residente o gasto com a Dívida Pública, que todos os anos consome quase metade da Despesa Geral da União. Para 2021 a previsão de gasto com o pagamento do serviço da Dívida Pública Federal será de cerca de 53% do fundo público federal. A Dívida Pública é a principal ferramenta de captura do Estado brasileiro, seus entes subnacionais (Estados, DF, Municípios) e de toda população brasileira, em favor da garantia de lucros crescentes ao grande capital financeiro rentista (especulador) e as grandes corporações. A segunda parte, é o chamado orçamento primário, onde verdadeiramente reside o Estado Social brasileiro, com suas funções primárias (Educação, Saúde, Assistência Social, Previdência Social, gasto com Pessoal, Cultura etc.).
O orçamento primário é composto de 28 funções. Todos os anos, o governo federal revê a previsão de gastos para elas. Sempre propondo redução das funções primárias, em benefício do pagamento do serviço da Dívida Pública Federal, anualmente. (por que no gráfico aparecem 16 funções, tem que explicar, mesmo em nota de rodapé)
Gráfico 1 – Despesa Geral da União em 2021 (R$ 4,147 trilhões), destacando a despesa com o serviço da dívida pública da União (R$ 2,236 trilhões)
Quando a Emenda Constitucional 95/2016 foi aprovada, ela colocou uma trava por 20 anos, somente no GASTO PRIMÁRIO DA UNIÃO, podendo sofrer atualização pelo IPCA/IBGE, do ano anterior. Mas o gasto com a DÍVIDA PÚBLICA, não tem limite e nem dotação orçamentária. Esse privilégio está garantido no Art. 166, parágrafo 3, inciso II, alínea “b”, da Constituição Federal. Confira!!!
Quando analisamos o gasto com PESSOAL/ENCARGOS SOCIAIS, da União, em relação ao PIB brasileiro, nos últimos 20 anos, constatamos que o excesso de gasto com servidores públicos federais, no Brasil é pura falácia. Entre 2000 e 2020, o gasto com PESSOAL/ENCARGOS SOCIAIS, em relação ao PIB, nunca chegou a 5%.
Fonte: SIOP(1), BC e IBGE
Se a previsão inicial da Lei Orçamentária Anual (LOA/2021), proposta pelo governo Bolsonaro e aprovada pelo Congresso Nacional, for executada, teremos um gasto com o Serviço da Dívida Pública Federal, na ordem de R$ 2,236 trilhões ou 26,99% do PIB brasileiro (R$ 8,287 trilhões, um valor bem superior ao da dívida pública) dos últimos 12 meses. Enquanto o gasto considerado excessivo pelo governo Bolsonaro, com PESSOAL/ENCARGOS SOCIAIS, cairá de 4,36% do PIB, em 2020, para 3,64% do PIB, em 2021. Podemos constatar que esse gasto excessivo com Pessoal/ Encargos Sociais é pura falácia!!!
Em 2020, o gasto executado com o pagamento da DÍVIDA PÚBLICA foi cerca de R$ 1,381 trilhão. Já a previsão para 2021, será na ordem de R$ 2,236 trilhões. Em relação a 2020, haverá um crescimento de gasto, em favor da DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL, cerca de R$ 855 bilhões. Como o presidente Bolsonaro e seu ministro da economia, Paulo Guedes, afirmam que o Brasil está quebrado, pode realizar um pagamento dessa monta?
Diante dos números oficiais do governo Bolsonaro, você ainda acredita que o gasto EXCESSIVO DO GOVERNO FEDERAL, reside nos gastos com o SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL, a ponto de propor uma Reforma Administrativa (PEC 32), com tamanha urgência? Ou o principal problema da Nação Brasileira, reside no PAGAMENTO DA DÍVIDA PÚBLICA ILEGÍTIMA, ILEGAL E ODIOSA?
Até setembro de 2021, o governo Bolsonaro já executou em favor da Dívida Pública Federal cerca de R$ 1,592 trilhão, do total previsto de R$ 2,236 trilhões ou 53% da DESPESA GERAL DA UNIÃO PREVISTA PARA 2021.[1]
Fiz um corte temporal em 2015 para uma pequena análise. Entre 2015 e 2020, o gasto primário da União, sempre foi maior, do que o gasto com o Serviço da Dívida Pública Federal. Em 2021 essa relação se alterou, como podemos constatar nos números abaixo.
Despesa Geral da União – 2020
Despesa Geral da União = R$ 3,535 trilhões
Pagamento ao Serviço da Dívida Pública Federal = R$ 1,381 trilhão ou 39,09%
Orçamento Primário da UNIÃO = R$ 2,154 trilhões ou 60,91%
Se a previsão inicial aprovada na LOA/2021 se concretizar, a relação da despesa Geral da União, com o serviço da Dívida Pública Federal será maior que o gasto primário.
Previsão na LOA/2021
Previsão Despesa Geral da União = R$ 4,147 trilhões
Previsão pagamento ao Serviço da Dívida Pública Federal = R$ 2,236 trilhões ou 53%
Previsão com Orçamento Primário da UNIÃO = R$ 1,911 trilhão ou 47%
Como podemos constatar, a partir dos dados oficiais do governo Bolsonaro, que o gasto da Dívida Pública Federal, em 2020, cerca de 39,09%, crescerá para cerca de 53%, em 2021.
Até setembro, a Despesa Geral da União executada, foi cerca de R$ 2,992 trilhões. Desse total cerca de R$ 1,592 trilhão, foi executado em favor do Serviço da Dívida Pública. Enquanto o Orçamento Primário executado, caiu para cerca de R$ 1,400 trilhão. Essa relação nos últimos 5 anos sempre foi maior que o Orçamento Primário. Mas em 2021 essa relação se alterará em favor da Dívida Pública Federal.
Se a previsão inicial da LOA/2021, se concretizar, haverá uma redução R$ 325 bilhões do Orçamento primário da União (R$ 1, 911 trilhão), em favor da dívida pública federal
(R$ 2,236 trilhões). Sem aprovação da Reforma Administrativa. Parou para pensar nisso?
Qual será o tamanho do enxugamento do Orçamento Primário da União, em favor da Dívida Pública Federal, a partir de 2022, se a Reforma Administrativa for aprovada?
Diante desses números podemos compreender quais os pilares centrais por trás da Reforma Administrativa. Desidratar o Orçamento Primário da União, onde reside o Estado Social (Saúde, Educação, Assistência, Cultura etc.), e transferir grande parte das despesas obrigatórias da União, em benefício do grande capital financeiro rentista e das grandes corporações, usando a sua principal ferramenta – DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL!!!
[1] https://www1.siop.planejamento.gov.br/QvAJAXZfc/opendoc.htm?document=IAS%2FExecucao_Orcamentaria.qvw&host=QVS%40pqlk04&anonymous=true&sheet=SH06